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sábado, 8 de novembro de 2014

“PERDE TEMPO”OU “POUPA TEMPO”? - Dinah Ribeiro de Amorim


“PERDE TEMPO”OU “POUPA TEMPO”?
  Dinah Ribeiro de Amorim

  Dª Sueli, aos setenta e cinco anos, tinha uma vida bastante ativa. Fazia exercícios diários, pintava, gostava de ler, frequentar festas, organizar serviços voluntários e, de vez em quando, escrever algumas poesias. Ia levando a chamada “nova idade” da melhor maneira possível. Seu maior prazer mesmo era dirigir, pegar o  carro e sair para uma bela estrada, num dia bonito de sol. Sentia-se livre, aventureira e independente.

  Ficou realmente muito preocupada quando notou que sua carteira de motorista estava vencendo. Dirigiu-se ao despachante mais próximo, achando que logo resolveria o assunto, mas com muita delicadeza e atenção, ele informou que teria que fazer exame médico novamente, agora, só no Detran. Ou, se quisesse, poderia tentar também nos Poupatempo da cidade, pois devido “a sua idade,” talvez tivesse menos fila, e poderia ser melhor atendida.
  Achou que mais perto seria o Poupatempo, Dª Sueli não perdeu tempo, e logo para lá se dirigiu. Muito bem atendida, indicaram-lhe a fila da 3ª idade, e não poderia fazer o exame de vista no mesmo dia, mas poderia marcar com antecedência e comparecer no dia e hora designados para ela. Como a fila estava comprida, perguntaram-lhe se não queria se sentar num banco adiante, que seria chamada na sua vez, pois a moça que marcava a consulta não estava atendendo no momento.

  Quanta gentileza! - pensou ela, sentando-se para aguardar. Após duas horas, dirigiu-se novamente à encarregada da fila que, com mil desculpas, colocou-a no lugar novamente,  afirmando ter esquecido de  chamá-la. Também, com tanta gente! Tudo bem - pensou ela, desejando marcar sua consulta e ir embora pois, já estava ficando realmente cansada.  “Acho que a idade já está me pegando,” (reflete).

  Finalmente, portando os papéis necessários para uma nova carteira, marcou um novo dia para seu exame de vista, não esquecendo antes do pagamento da taxa estabelecida, no banco existente ali mesmo, para esse fim.

  No dia combinado, compareceu ansiosa, louca para regularizar sua situação e tornar a dirigir seu carrinho que a levava, livre, a tantos lugares atraentes. Foi encaminhada novamente a uma fila especial, recebida com a mesma gentileza anterior, apresentou novamente os documentos necessários como da primeira vez, agora um pouco mais rápido, mas que decepção! A atendente pesquisou no computador e lhe disse que não poderia ainda fazer seu exame de vista, pois existia uma pendência na sua pontuação, vinda do DETRAN. Mas como! - pensou ela, não havia recebido nenhuma notificação, algumas multas que tivera sempre foram pagas corretamente, deveria haver algum engano.  Seus documentos estavam em ordem. Os funcionários se entreolharam e, resolveram encaminhá-la a um departamento do DETRAN, mais próximo, no centro mesmo, próximo ao Perdetempo, isto é,  Poupatempo para perguntar o que havia acontecido. Realmente, seria mais fácil para ela, “devido à idade,” com menos gente. Só não sabiam se estaria funcionando naquele horário. “Que sorte - pensou ela, em sua inocência.” “Fica aqui ao lado. Quem sabe ainda volto hoje mesmo e resolvo tudo.”

  Chegou ao prédio indicado, cheio de gente e com vários casos. Foi encaminhada a uma nova fila especial, atendida por um senhor muito gentil que olhando também pelo computador lhe disse que havia tido alguns pontos a mais. A contagem agora não era mais anual, mas outro tipo de contagem que ela não entendeu muito bem e, como sua carta estava vencendo, não poderia guiar até fazer um novo exame de trânsito, realizado no próprio DETRAN, passando antes por um julgamento do caso e de quanto tempo seria sua penalidade, sem poder dirigir!

  Pronto, Dª Sueli estava agora não só muito contrariada como entristecida, sentindo-se uma condenada por ter pretendido renovar sua carteira de motorista, cansada de tanta correria, recebendo e ouvindo novidades que, para ela, com tantos anos de trabalho em periferias de São Paulo, nunca  haviam acontecido. As coisas estavam se tornando mais difíceis ultimamente.
  E a escola do DETRAN, onde deveria fazer o curso, entrou em férias!

  Depois de muitas perguntas, encontrou uma escola do DETRAN perto de sua casa, e fez o curso pela Internet. Um advogado foi contratado, conseguindo lhe uma penalidade adequada ao caso e, finalmente,  adquirindo boa nota, para espanto de alguns, foi aprovada e ganhou o direito de fazer seu exame de vista, recebendo a carteira de motorista e permissão para guiar novamente. Que coisa boa!

  Muito satisfeita, recebeu essa notícia em Paris, através do celular, meio esquecida do fato, entrando na catedral de Notre Dame para ouvir um belo coral.

  Dª Sueli, realmente, sabia levar com sabedoria a sua “nova idade”.



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