A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

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quarta-feira, 24 de abril de 2024

O LAGO DE TUALATIN - Alberto Landi

 




O LAGO DE TUALATIN

Alberto Landi

 

O lago de Tualatin está localizado nos arredores da cidade de Portland, Oregon, é um dos poucos refúgios urbanos nacionais.

É um lugar fantástico, pois há uma grande variedade de aves como flamingos, gaviões, falcões, garças-azuis e diversos pássaros.

Situado na planície de inundação do Rio Tualatin, esse refúgio tem muitas espécies que escapam muitas vezes aos olhos de quem a visita.

Margeando o lago há pequenas mesas e alguns fast-food para quem deseja passar o dia e apreciar a beleza local.

Em suas águas límpidas e transparentes, havia um flamingo que se destacava dos demais, uma ave elegante, de uma coloração exuberante, admirava a sua imagem nessas águas.  Plumagem rosada, peito delicado, parecia um top-model desfilando na passarela, marcas pretas na frente da asa, alimentação a base de camarões, algas, crustáceos e plânctons, cauda curta, asas grandes e musculosas, pés palmados, ótimos aliados para agarrar o fundo de lagos, vôo bonito e rápido.

Mas era uma imagem que não lhe agradava, na verdade, queria ser um predador voraz, uma ave de rapina.

Decidiu contatar um falcão, pois admirava as suas asas longas e afiladas, cauda curta, uma aerodinâmica adaptada a voos rápidos e execução de manobras ágeis. Plumagem cinzenta azulada no dorso e asas, cabeça preta, bico escuro com base amarela e pernas da mesma cor.

O falcão por sua vez começou a fazer amizade com o flamingo, dando algumas orientações de como se comportar e viver da caça.

Em uma das lições dadas foi como abater pequenos roedores com o bico.

— Vá em frente e caia de bico neles, diz o falcão.

O flamingo não estava se adaptando com os possíveis novos costumes e com muita pena dos roedores recuou, como dizendo isso não é legal.

O falcão ficou bravo e disse ao flamingo que ele precisaria se consultar com a coruja terapeuta, para perder o medo.

Com pouca conversa, a coruja percebeu que o flamingo não iria se adaptar com o novo habitat, e o convenceu   para se aceitar da maneira como ele é e vive, se assumir sem nenhuma culpa.

Moral da história: Uma vez flamingo, sempre flamingo.!

 

Destino, o que é o destino! - Helio Salema

 


Destino, o que é o destino!

Helio Salema

II Capítulo

 

Bento e Gregório eram amigos desde os tempos de colégio. Nos fins de semana se reuniam com outros amigos na prática de esportes.

Mesmo quando Gregório mudou-se para outra cidade a fim de cursar engenharia mecânica, em alguns fins de semana regressava para a sua cidade natal e era animada a reunião com os antigos amigos.

Após formatura mudou-se para outro Estado. Nos últimos dois anos só se falavam por telefone. Bento, ao concluir o Segundo Grau, dedicou-se as lojas do pai, que já apresentava sinais de doença grave.

 

Hoje, aniversário do Bento, Gregório retornou para fazer uma surpresa ao amigo. A mulher no carro em chamas era ex-namorada do Gregório, que terminou com ele assim que ele saiu para outro Estado. Talvez por isso que Gregório não retornava a sua cidade natal.

 

Ao ouvir o grito do Gregório:

— Sai daí…

Bento acatou a ordem do amigo e foi-se afastando em direção a

Gregório e ao bebê.

Um carro para próximo e um casal sai correndo. O marido que era bombeiro consegue abrir a porta do carro e retira a mulher. A conduz para junto do seu carro, onde sua esposa que é médica logo começa a examinar a vítima. Balança a cabeça!!!

 

Outros veículos foram chegando, inclusive a viatura policial. Com o uso de vários extintores o fogo foi sendo dominado. Do veículo quase nada restou. As várias malas e sacolas eram, agora, um monte de cinzas.

 

Bento que reconheceu a mulher, Maria Clara, ficou sem saber como dizer ao amigo Gregório, que continuava segurando o bebê, como um pai dando todo carinho do mundo ao filho, que pouco antes estava chorando, desesperadamente.

 

Os policiais quiseram saber quem eram os três, que a princípio pareciam serem os sobreviventes. Gregório explicou que de longe viu quando o carro perder o controle, atravessou a pista e bateu de frente na árvore. Parou para socorrer, em seguida seu amigo chegou e conseguiu tirar a criança. Eles se afastaram com receio de explosão. Então aquele casal parou e o homem conseguiu retirar a mulher, enquanto outras pessoas apagavam as chamas.

Um policial perguntou se conheciam as vítimas. Bento relatou que a criança era filho da mulher, cujo marido era “AQUELE SUJEITO” que matou um casal e fugiu, no mês passado:

—Talvez ela estivesse indo ao encontro dele.

E os parentes da criança?

— A mãe, e o irmão da vítima foram embora, sem deixar endereço, logo após ela se juntar ao tal cara que apareceu na cidade. Ninguém nunca soube quem ele era nem de onde veio.

— Então o bebê não tem parente?

Bento olhando para Gregório:

— Talvez…Sim.

O policial foi chamado à viatura.

Bento ao perceber o terrível espanto no semblante do amigo:

— Este menino nasceu de parto normal sete meses depois que você foi embora e não mais voltou. Sempre estivemos em dúvida, mas como você nem ela, jamais comentaram sobre o término do namoro, decidimos ficar calados.

 

 

 

CINCO ANOS DEPOIS

 

Mais um fim de semana que Gregório retorna a sua cidade. Nestes últimos cinco anos foram pouquíssimos os que não esteve presente. Hoje um dia especial. Na escola Bento e seu filho Sandro e o amigo Gregório com o seu filho Gregorinho. Terminada a festa do Dia dos Pais, foram os quatro almoçar.

 

Após o almoço, decidiram ir até um parque onde as crianças encontraram outros amigos. Enquanto a turminha brincava, animadamente, Bento e Gregório ficaram conversando e admirando o entrosamento dos filhos. Por um instante, o silêncio dominou entre os amigos, quando Gregório bastante emocionado:

— Destino. O que é o destino?

Bento percebeu que o amigo queria revelar alguma coisa importante, continuou calado. Gregório, em tom de desabado, começa a relatar:

— Quando eu falei para Maria Clara que tinha conseguido um emprego, ela demonstrou-se muito contente. Ao saber que era em outro Estado mostrou-se surpresa. Tentei explicar que era muito importante para mim.

Foi quando ela respondeu:

— Vai e seja feliz. Não precisa voltar.

— Assim terminava um relacionamento que para mim seria eterno. Eu só comentei com minha mãe e minha irmã, pedindo que não falassem nada, pois eu não sabia como estaria tempos depois. Dias antes do acidente, minha irmã telefona e diz que minha mãe estava muito doente. Decidi vir e escolhi, justamente o dia do seu aniversário. Era uma surpresa que desejava muito lhe fazer. Só acreditei que era o pai, depois do resultado do DNA, embora estivesse muita vontade de criá-lo como filho.

Mesmo que o pai fosse outra pessoa. Tendo pensado e refletido muito.

 O que é o destino???

 

 

PAIS ADOTIVOS LEGAIS! - Dinah Ribeiro de Amorim

 



PAIS ADOTIVOS LEGAIS!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Bento e Rogério, amigos inseparáveis, levam a filha adotada à escola. Aos seis anos, já vai frequentar o primeiro ano, menina precoce e muito inteligente, quase alfabetizada.

Orgulhosos e preocupados, percebe-se o carinho que sentem pela menina Luiza, que caminha entre os dois, ansiosa para conhecer a nova professora. Não os chama de pais, mas de tios, embora more com eles.

Os amigos a adotaram uns cinco anos antes, após salvá-la de terrível acidente em estrada, um capotamento de carro, que se incendiou rápido.

Conseguiram tirá-la, ainda bebê, presa na cadeirinha do banco de trás, aos berros. Os pais, inconscientes, morreram na explosão.  Mal deu tempo de eles correrem e se salvarem.

Essa tragédia deixou-os em choque por muitos meses, não sabendo direito o que fazer com a criança pequena e com dó de entregá-la a estranhos. Segundo a polícia, só havia uma avó materna ainda viva que, com o sofrimento dessa perda, ficou sem condições de educar a neta, interna em casa de repouso.

Inexperientes, os dois amigos resolvem recorrer ao Juizado de Menores, explicar a situação e a vontade de adotá-la.

Assim, a pequena Luiza cresceu, amada e criada, com dois papais ou titios.

Logo no primeiro dia de aula, as crianças notam que vem à escola com os dois amigos e, sem a mãe, como todas elas. Estranham e começam a observá-la, curiosos.

Luiza já começa a se destacar dos outros alunos. Desperta a curiosidade dos coleguinhas que perguntam, várias vezes, se não tem mãe ou qual deles é seu pai?

A menina, desembaraçada, responde que foi criada por eles, mas, realmente, não conheceu os pais, chama-os de tios. Descobre nela atenção sobre eles, como veio ao mundo e acabou sendo criada por Bento e Rogério. Demonstra não saber nada sobre o acidente.

Os dias passam alegres na escola, com Luiza que é a mais inteligente e capaz. Torna-se líder da criançada nas atividades escolares e brincadeiras.

Às vezes, volta para casa, meio quieta, o que não é normal, quando avista os coleguinhas sendo abraçados por suas mães.

Os dois amigos, preocupados, sentem que está na hora de contar-lhe a verdade, como veio viver com eles. Mas compreendem que terá um grande choque. Não está preparada para isso. Sentem a sua necessidade de saber sobre os pais, principalmente da mãe, quando toda criança depende da criação e do amor materno.

A menina Luiza, somente com eles, não demonstrou essa falta de carinho, mas, no meio das outras crianças, seus primeiros contatos sociais, começa a manifestar essa ausência carinhosa comum aos coleguinhas.

O que fazer? Foram criados longe dos pais, enfrentaram seus problemas sozinhos, venceram razoavelmente na vida, a ponto de se compadecerem dos problemas alheios, como aconteceu no caso de Luiza. Mas, falar sobre a ausência dos pais dela, da falta que faz uma mãe, não sabem como revelar isso a uma menina de seis anos.

Por mais que tentem agradá-la, considerá-la como filha, não conseguem substituir o amor do pai e da mãe verdadeira.

Após conversarem e meditarem sobre o assunto, resolvem pedir o auxílio da irmã de Bento, casada, com três filhos, para orientá-los como agir como verdadeiros pais e explicar à menina o porquê está com eles.

Carolina, a irmã de Bento, compreende logo a situação e já previa que teriam problemas nesse sentido. Percebia, achando graça, como agiam com Luiza, tratavam-na como se fosse um homenzinho, fazendo-a participar da vida deles. Vestiam-na com roupas esportivas, levavam-na a jogos ou a brincadeiras de meninos, não era tratada como uma menina delicada e sim como eles gostariam de ser tratados na infância. Isso chamou a atenção dos dois amigos, creram nas verdades que a irmã de Bento falava. Precisavam mudar de atitude em relação a Luiza, se quisessem que fosse feliz como menina e, mais tarde, como mulher.

Queriam o bem dela e pretendiam mudar o comportamento. Contavam com Carolina, para isso.

Incentivam Luiza a passar uns dias de convivência com a tia Carolina.

— Por que isso? Pergunta a menina.

— Gosto de viver com vocês. Acho que vou acabar brigando com os primos. E é mais longe da escola.

Bento, entristecido, responde que é só por uns tempos, para a tia ensiná-la melhor como se vestir, brincar com sua filha, ter mais amiguinhas.

Luiza, conformada, quando fala em brincadeiras e ter mais amigos, concorda. Gosta de se socializar.

Realmente, na casa da tia, a menina começa a se divertir e gostar. Brigam um pouco também, comum na criançada, mas sente-se bem e é tratada como uma prima querida ou filha, pela tia, que lhe oferece carinhos iguais aos filhos. Sentia falta de uma mãe!

O tempo passa e Luiza sente, às vezes, saudades de Bento e Rogério, o mesmo acontece também com eles. Parece que perderam uma filha, de verdade.

terça-feira, 23 de abril de 2024

AS MENINAS DA CASA VERDE! - Dinah Ribeiro de Amorim

 



AS MENINAS DA CASA VERDE!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

José Arouche de Toledo Rendon foi uma das principais figuras do início do império brasileiro. Militar, participou de diversas batalhas, tornando-se, mais tarde, o primeiro diretor da Faculdade de Direito de São Paulo, repassando o seu salário para as obras da Santa Casa de Misericórdia.

Possuía um sítio de janelas verdes, que ficou conhecido pelo nome de Sítio das Meninas da Casa Verde, suas sete irmãs: Joaquina, Caetana, Gertrudes, Pulquéria, Maria Rosa, Ana Teresa e Reuduzinda. Costumava levá-las ao sítio todo final de semana, e, embora solteiras, chamavam muita atenção pela beleza e formosura que apresentavam.

Esse lugar passou a atrair quem passava, não só pelas famosas irmãs, mas também por ser o primeiro exportador brasileiro de café.

Com o tempo, o povo acostumou-se e adotou o que achou mais importante: As Meninas da Casa Verde.

Sempre juntas, cabisbaixas, muito recatadas, eram elegantes, bonitas, mas simples, aparentemente.

Joaquina, a mais velha, muito enérgica, brigava por qualquer motivo que a desagradasse. Exigia obediência e disciplina, chegando a ataques de fúria, caso não a obedecessem. Nunca pensou em namoro ou casamento, nem permitia que suas irmãs casassem. Morreu solteira.

Caetana, meio distraída, meio sonhadora, vivia imaginando histórias e como não sabia vivenciá-las, fugia um pouco da realidade, cantava e dançava sozinha, sendo motivo de risadas. Também morreu solteira.

Gertrudes, a do meio, era muito séria, estudiosa, gostava de ler sobre Ciências, curiosa sobre a vida humana, demorando horas a observar um inseto ou formiguinha. Se pudesse, seria uma ótima médica, profissão ainda não permitida às mulheres. Não se relacionava bem com as irmãs, nem com as pessoas jovens como ela, ficou solteira.

Pulquéria, a mais bonita, a mais simpática, era muito agradável e ambicionava viver bem na sociedade, procurava um marido rico, libertar-se das irmãs, o que não aconteceu pela indisposição do irmão com quem ela escolheu. O sonho não se concretizou.

Ana Teresa, a nervosinha, choramingava à toa, não podia ouvir um comentário ou história triste, que soluçava ou desmaiava, dando trabalho sério à família. Necessitava de médico, às vezes. Dependia muito da atenção das irmãs.

Reuduzinda, a penúltima delas, como o próprio nome indica, reduzia ou diminuía tudo que encontrava. Gostava de plantas, mas podava-as tanto que nunca chegavam a crescer. Com as roupas, vivia cortando barra dos vestidos ou das saias, queria diminuir o tamanho. Já era uma precursora dos modelos modernos que viriam, gostava de moda e de criar novidades. Não era apreciada pelas ideias.

Maria Rosa, a caçula delas, a mais engraçadinha de todas, bonita, gentil, delicada, vivia sorrindo e brincando com todos. Era dócil e via beleza, em tudo o que encontrava. Amava a vida, a natureza e as irmãs. Apaixonada por cavalos, costumava cavalgar horas, pelas manhãs, quando iam ao sítio, nos finais de semana.

Todos gostavam dela e, quando a viam, diminuíam o passo, desejosos de um olhar ou de um sorriso. Ela retribuía sempre com gentilezas.

Seu irmão, preocupado com a segurança, contrata um rapaz para servi-la, durante as cavalgadas, temia que sofresse alguma agressão ou queda. Rapaz de origem humilde, filho de uma antiga serviçal da casa, completou seus estudos em Portugal, auxiliado por um médico do imperador, impressionado com a inteligência e aparência dele. Chamava-se Walter e era muito educado, elegante e bom servidor. Prefere voltar às origens.

Encanta-se de imediato com Maria Rosa, e procura tratá-la com amabilidade e respeito sem igual.

A jovem, ao vê-lo, também simpatiza com sua gentileza e distinção, diferente dos outros servidores do sítio. Travam logo grande amizade.

Com o tempo, essa amizade se transforma em atração e amor, sendo as cavalgadas de Maria Rosa e Walter, mais demoradas e diárias.

As irmãs começam a notar o rosto afogueado, as demoras, as distrações dela, ao chegar dos passeios; inicia-se o cochicho entre elas, as intrigas, principalmente com Joaquina, que teima em saber o que está acontecendo.

Insiste em acompanhar Maria Rosa, quando sai a cavalgar e, embora disfarcem, logo percebe que existe um namoro entre os dois. Na primeira oportunidade, corre a levantar as suspeitas ao irmão, praticamente o chefe da casa e da família.

José Arouche, intrigado, chama Walter no escritório e manda Joaquina trancar Maria Rosa, no quarto.

Sentada na cama, a jovem esconde o rosto no lenço e chora, tristemente, sem entender a razão da atitude deles. Afinal, é moça solteira, em idade certa para namoros e casamentos, e gostou de Walter, indicado pelo próprio irmão para protegê-la. Qual é o problema?

_ Com que então, Sr. Walter, anda de conversinhas com minha irmã, durante as cavalgadas? Pergunta José Arouche. “E qual é o assunto tão importante, além da montaria, para demorarem tanto?”

Walter, cabisbaixo e envergonhado, responde que sempre foi muito respeitoso com Dona Maria Rosa, mas, realmente, não conseguiu dominar o coração. Além dos cuidados normais, começou a sentir grande amor por ela e estava disposto a desistir de sua vida no sítio, se isso o desagradasse. Sabia que havia uma grande diferença social entre eles, que esse amor era impossível de acontecer, gostaria de casar-se com ela, mas aguardava o desfecho que o patrão daria ao caso.

José Arouche, surpreso com a sinceridade do rapaz, meio sem jeito, afinal também foi jovem e, muitas vezes, apaixonado, lembrou que Walter foi indicação de Dr. Gomide, médico do imperador, e recém-formado em Contabilidade, no Império. Resolve pensar melhor no assunto e consultar Maria Rosa. Afinal, sete irmãs solteiras e só ele responsável pelo futuro delas.

Walter, esperançoso, sai da sala com ar sorridente e é visto pelas irmãs, escondidas, que correm a fofocar no quarto de Maria Rosa.

Esta, ao saber o final da conversa, aguarda o irmão, temerosa.

Joaquina, revoltada, vai buscá-la e a introduz no escritório do irmão, que a recebe sisudo e preocupado. Decidir o futuro da irmã caçula.

José Arouche percebe os olhos vermelhos da irmã chorosa e já adivinha a resposta que irá obter.

_Gosta desse moço, Maria Rosa? Ele a ama e quer meu consentimento para noivarem. Percebe que é filho de empregados, embora esteja em situação melhor que os pais? Apresenta dignidade e estudos, mas não é do nosso nível, nem o que imaginei para você. Está disposta a enfrentar a situação?

A moça, espantada, sorri para o irmão e responde rápido:

_Também o amo. Serei feliz com ele.

Diante disso, José Arouche permite que o casal namore, noive e se case, observando os costumes tradicionais para que isso aconteça.

Responde à irmã caçula, tão cativante, também a sua preferida:

_Sejam felizes!

O casal, feliz, prepara-se para o casamento. Uma elegante e agradável festa de noivado é feita no sítio, com a presença dos vários tipos de convidados, camponeses e fidalgos, para aceitação e modificação dos preconceitos.

Walter tem que ir a Portugal, a mando do Cartório Civil, para legalização do Diploma e atualização de documentos. Despede-se de Maria Rosa, triste, e promete voltar o mais breve possível. Dirige-se a Santos para o embarque do primeiro navio que sai em direção à Europa.

Acontece forte tempestade durante a navegação e o navio naufraga. Poucos tripulantes se salvam. Infelizmente, Walter não foi um deles.

Maria Rosa acaba vivendo no sítio, junto às outras irmãs, desolada e triste.

É, as sete meninas da Casa Verde morrem mesmo solteiras...

 

Uma das meninas da Casa Verde - "Pulquéria" - Hirtis Lazarin

  



A menina mais nova da família Arouche

Hirtis Lazarin


                                           Blem, blem

                                           Blim,blem

                                           Bleimmmmm

                                           Blem, blém


Era o sino da fazenda gritando:

                                                      Nasceu mais outra menina

                                                      Acreditem

                                                      A sétima da mesma família

                                                      Ela veio na surdina?

                                                      Não… Não…

                                                      Foi projeto da medicina.


Logo depois que a menina chorou, uma gritaria começou no quarto.


Eram o pai, a mãe, a avó e a tia. Todos se achavam no direito de ajudar na escolha do nome da menina. 


Por que a mãe não decidiu isso antes? Nem ela soube responder, apesar de ser a filha número sete. Já tinha experiência suficiente no assunto.


E eu, a parteira, só conseguia ouvir um amontoado de sílabas. Até elas, inimigas, chocavam-se no ar: ploft, ploft, ploft. 


Uma hora depois, chegou-se a uma concordância e o nome foi escolhido. Vocês podem nem acreditar. Juntaram algumas sílabas, as preferidas de cada um, e o nome foi formado: 


Pul (do pai)

qué (da mãe)

ri (da tia) 

a (da avó)


A avó até reclamou por conta da pequinês de um simples “a”.

                                       Pul - qué - ri- a

                                            Pulquéria


A recém-nascida, já bem vestidinha no berço, abriu um berro. 

Só se acalmou com um comprimidinho que o médico ministrou.


quinta-feira, 28 de março de 2024

Quem era ela? - Hirtis Lazarin

 



Quem era ela?

Hirtis Lazarin

 

 

A rua já estava quase deserta. Já se ouvia o cri-cri-lar dos grilos. A lua iluminava só um tantinho. Não havia nenhuma estrela. Uma sexta-feira diferente. Bem que meu avô falava que não devemos andar em noite de sexta-feira, principalmente se não tiver estrela. Nessas noites, da escuridão vêm visões para assustar as pessoas.

Mas é claro que Rafa, doze anos, não sabia dessas coisas, quando resolveu partir pra uma aventura. Ou, se já ouvira falar, não acreditava. Morria de rir quando contavam histórias de fantasmas e ele caçoava dos amigos medrosos.

Naquela sexta-feira, os pais chegariam bem tarde.  Estavam na Capital resolvendo negócios do trabalho. O menino achou, então, que era sua oportunidade de conhecer uma tal casa abandonada. Fazia tempo que essa vontade não saía de sua cabecinha fantasiosa.

Já ouvira muitos comentários a respeito. Uma história que vinha sendo contada de geração a geração e que virou lenda na pequena cidade do interior.

A curiosidade do menino só aumentava a cada detalhe acrescentado ao que já sabia.  Há quarenta anos, aconteceram várias mortes suspeitas na família que lá morava.  Sobrou apenas o pai. Ele abandonou tudo e desapareceu. Nada foi levado. E nunca mais tiveram notícia dele.

As pessoas foram assassinadas ou contraíram alguma doença contagiosa? 

Não havia registros médicos nem na justiça.

E o povo foi inventando coisas e a história foi aumentando. Não tinha fim.

Rafa não podia deixar sozinha sua irmã Bia, de apenas cinco anos. É claro que não lhe contou a verdade. Seria apenas um passeio. A menina pulou de alegria e queria levar bichinhos de pelúcia. É lógico que o irmão proibiu, garantindo outras surpresas.

Estavam caminhando há mais de meia hora e já estavam bem longe. As casas da rua ficaram poucas. Os galhos de árvores muito altas e copadas atrapalhavam as luzes dos postes elétricos. E, ainda mais, um vento não muito forte balançava as folhas verdes. Nesse vaivém divertido, tênues sombras eram projetadas como se fossem fantasmas irreverentes e zombeteiros.  Bia, na sua inocência, brincava com eles. 

Ei… Afinal… Lá estava a tão famosa casa, bem afastada da rua e rodeada de mato alto. 

Não foi fácil chegar até a porta de madeira apodrecida. As paredes eram verdes por conta das ervas que foram crescendo ao seu entorno; cresceram agarradas à construção e se apoderaram dela. 

O trinco… Ah! O trinco… Não ofereceu resistência. Tudo escuro.  Não se enxergava e não se ouvia nada. A lanterna? O menino era precavido e não se esqueceu dela. Clareava muito pouco, talvez um palmo diante do nariz. Deu pra ver um rato magricelo e comprido correndo pela sala. Saiu debaixo de um sofá e, silencioso, desapareceu num raio só. Ainda bem que Bia nem viu, empolgada pela descoberta de coisas diferentes. Era tudo igual ao desenho animado do “Menino que morava sozinho na floresta” e ela adorava.


Os móveis estavam cobertos por panos que já foram brancos.  Era poeira e teias de aranha que não acabavam mais. O assoalho estalava a cada passo. Era o som desafinado da corda única de um violão guardado e esquecido no armário.

Os dois chegaram à cozinha. ENORME!  Um estival de baratas zanzava por tudo. Pareciam as donas do lugar e ignoraram os visitantes. Em cima do fogão enferrujado estavam panelas sujas e destampadas. O cheiro era forte.  As crianças tossiam sem parar e foi preciso interromper, por um tempo, a exploração. Mas a empolgação continuou firme e forte. Um armário alto estava aberto e cheio de louças e vidros. Tudo bem arrumadinho. Acho que não faltava nada. As cadeiras em volta da mesa estavam organizadas, mas faltavam duas delas, as da ponta. Um vaso que já viu uma flor estava no centro, sozinho e triste. 

Rafa, em algum momento, sentiu medo. Não medo de fantasmas, mas que aparecesse alguém. Faltavam os quartos, lá em cima, no primeiro andar. Eram vários. Tudo era muito espaçoso. Muita gente morou ali.

Ele tirou o celular do bolso e fotografou tudinho. Olhou as horas e se assustou: oito horas da noite. Não tinha tempo pra enrolação. Agarrou as mãos de Bia, prontos pra acessar a parte de cima. A esperança era que lá encontrariam coisas interessantíssimas.

Estavam ainda nos primeiros degraus da escada quando uma luz forte clareou tudo. 

Uma voz rouca e brava gritou:

— Quem são vocês? O que fazem aqui?

Era uma velha, mas tão velha, que seu rosto parecia jornal de ontem dobrado e amassado. O nariz era comprido, igual ao da bruxa que envenenou Branca de Neve. 

 

UM POUCO DE HISTÓRIA! - Dinah Ribeiro de Amorim

 



UM POUCO DE HISTÓRIA!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Senhor Hiroto Kurasawa, imigrante japonês radicado há anos no Brasil, medita e lembra os fatos da vida que conheceu. Recebeu de sua neta, Paula Yumi, um convite para acompanhá-la à cidade de Kyoto, no Japão. Ela estuda cinema e é louca para conhecer a famosa indústria cinematográfica e televisiva japonesa, sediada em Kyoto, com muitos jidaigeki, filmes de ação samurai.

Hiroto sente vontade de voltar ao Japão, todo modificado, restaurado depois da segunda guerra, principalmente Kyoto, que conserva até hoje habitações antigas, não atingidas pelas guerras sofridas, com alguns detalhes ainda medievais. Na cultura, certas danças e músicas como Takigi-noh e Gagaku ainda são tocadas e muitos parques e templos budistas, lembram a sua infância.

Sentado na sua poltrona predileta, não consegue deixar de pensar no passado, quando foi uma das crianças foragidas de Hiroshima com o ataque da bomba nuclear lançada pelos Estados Unidos, em 6 de agosto de 1945, matando cerca de 250.000 pessoas, sendo as crianças vivas levadas para recuperação em Kyoto, que era ainda a capital do Japão.

O alvo seria Kyoto, que foi salva da bomba atômica pela intervenção do Secretário de Guerra americano Henry L. Stimson, que queria poupá-la por ser grande centro cultural, conhecido por ele, anteriormente, durante viagens diplomáticas e lua de mel.

Escolheram então Hiroshyma por ser sede do governo militar japonês. Esse incidente trágico colocou um ponto final na guerra do Pacífico, e transformou a cidade de Hiroshyma hoje, como a escolhida para ser o centro da paz mundial. Com o Tratado de São Francisco, em 1951, o controle da cidade foi devolvido ao Japão.

Em menino, Hiroto foi criado por uma família jovem, que resolveu, juntamente com outras crianças, emigrar ao Brasil, em busca de melhores condições de vida. Isso em 1958, quando já entrava na adolescência.

De espírito rebelde e revoltado, passa por terríveis situações, desde a dificuldade da língua na escola, ridicularizado pelos colegas, até os costumes alimentares, econômicos, etc.

Inicialmente, o padrasto se estabelece num bairro popular e pobre, em São Paulo, na tentativa de montar uma tinturaria. Sabia mexer bem com algodão e outros tipos de pano.

A família aumenta, nascem novas crianças que dificultam muito o sustento e a educação.

O pai falece cedo, por excesso de fumo e bebidas, e o menino, aprende a viver sozinho, deixando a mãe criar e educar os outros irmãos. Foge de casa, vai ao interior, à busca de qualquer trabalho que o sustente. Na plantação, descobre, que para juntar dinheiro, a maioria dos imigrantes o escondia em buracos, na terra.

Aprende a lidar com tudo, desde a fazer barbas e bigodes até a viver algum tempo na praia, vendendo peixes e colares de conchas. Percorre lugares estranhos, queimado pelo sol, cabelos compridos, era aceito entre pescadores, tribos indígenas, grupos de hippies, enfim, como jovem, passa por várias experiências.

Percebe que os japoneses que queriam viver bem, no Brasil, adotavam a religião cristã, e colocavam à frente dos nomes japoneses, um português, para ser melhor aceito como cidadãos brasileiros. Isso causava-lhe revolta.

Mais velho e amadurecido, faz amizades com um grupo de japoneses que moravam no interior de São Paulo, Araras, sentindo-se mais comunicativo e adaptado com os da mesma origem e raça. Uma comunidade evangélica.

Com o tempo, converte-se ao Cristianismo e ameniza suas revoltas íntimas.

Como característica de todo japonês, torna-se sistemático, trabalhador e produtivo, estabelecendo-se como plantador de laranjas, em fazendas. Mais tarde, conhecido no ramo, aumenta o trabalho e a produção, e compra novas terras.

Hiroto se transforma em fazendeiro de renome, resolve formar família e ajudar os irmãos que havia deixado. Contribui também à riqueza do estado, sendo, atualmente, São Paulo, um dos maiores exportadores de laranjas do país.

Casa-se com Alice Sayoko, tem quatro filhos, dois homens, Milton Mikio e Pedro Takashi e duas mulheres, Ana Yoko e Olívia Tieko, todos direcionados à agricultura e aos estudos, com diplomas universitários.

Alguns costumes conservam até hoje, na bela e confortável casa de fazenda, em alimentação e cultura.  Gosta dos pratos e sopas com tofu, cozinha peixes temperados com shoyo, muitos vegetais e frutas. Não se acostuma com os talheres brasileiros, usando até hoje os famosos palitos japoneses. Um pouco de saquê, ocasionalmente, bebida semelhante à nossa pinga, ajuda a aumentar o apetite. Muito saboroso é o seu yakissoba, de carne, vegetal e frango.

As músicas e os filmes japoneses, assiste na moderna televisão, dando preferência e descartando os ocidentais. A saudade do Japão que ficou, a modernização e a paz atual, o atraem. A vontade de voltar, às vezes, o ataca, não para morar, adotou o Brasil como sua pátria, mas para reconhecer as boas mudanças.

Gosta de lembrar da batchan, a pseudo avó que ficou no Japão quando vieram, fortemente budista, visitou o Brasil somente para assistir ao casamento dele, já convertido ao cristianismo. Teve que fazer dois casamentos: um em casa, com a estátua de Buda e vestimentas budistas, e, assim que ela se foi, o casamento na igreja cristã, a qual seguiam. Foi muita correria e atrapalhação, mas deram risadas depois.

Com muitos trabalhadores a seu serviço, sendo, atualmente, só o administrador dos negócios, dedica-se aos netos, com paixão, seus herdeiros na descendência. Não consegue negar a eles nenhum pedido ou vontade.

— E aí, vovô, vamos ao Japão? Não quero perder essa oportunidade, pergunta a neta Yumi.

— Acho que sim, Paula, vou gostar muito de rever a minha Terra e a minha gente.

E teve Hiroto a mais bela de suas aventuras, no final da vida!

 

 

quarta-feira, 27 de março de 2024

O caracol e a borboleta. - Hirtis Lazarin

 




O caracol e a borboleta.

Hirtis Lazarin

 


O jardim estava festivo e cheirava a flor. Afinal de contas, já era primavera.

O caracol arrastava-se, cuidadosamente, na grama verde e bem cuidada em direção ao amontoado de folhas juntadas pelo jardineiro.

A fome era maior que tudo. Maior que a girafa, maior até que o elefante.

Mas não tinha pressa. Carregar uma casa nas costas exige calma e esforço, e a natureza sabe escolher os mais fortes para determinada missão. 

 Ele sentia muito orgulho de ser do jeito que era.

De repente, aparece uma borboleta. Suas asas eram um misturado de amarelo e azul. Linda de viver sob os raios de sol. 

Leve e ágil feito uma pluma, ela voava pra cá e pra lá entre tantas rosas e jasmins. Parecia uma dançarina. Escolhia as flores mais apetitosas. Era muito néctar pra uma borboleta só. 

Depois de tantos voos e já bem alimentada, viu o caracol e observou seus movimentos. A lentidão do molusco incomodou-a e, num ímpeto, gritou: 

— Caracol preguiçoso! Se continuar assim, não vai sobrar nada pra você. O mundo de hoje é muito competitivo. Vence o mais rápido, o mais esperto.

— Nasci assim. - Respondeu.  Não podemos alterar o que a natureza fez. — Resmungou o caracol. E continuou o seu caminho, bem tranquilo, sem se influenciar pelo comentário maldoso.

Não satisfeita, acrescentou:

— Sempre vence o mais rápido, o mais esperto. Eu voo pra todos os cantos e vejo coisas que você não vê.

— Ok, mas a democracia permite que cada um pense como quiser. Não se preocupe comigo.

A borboleta não se convenceu e continuou atormentando o pequeno molusco.

E ele seguiu cantando feliz da vida. Conhecia suas limitações, convivia com elas e sabia como lidar com todas.

Catarina, uma menina desastrosa, entrou correndo e, quando passa pelo jardim, deixa cair, pra todos os lados, um balde cheinho de água. 

Um desastre!

A borboleta, desprotegida e frágil, morreu afogada. Morreu sem saber o que aconteceu. 

E o caracol, rapidamente, encolheu o pescoço e se guardou dentro da sua concha.

 

MORAL DA HISTÓRIA: “Todos nós temos limitações e vale respeitar a limitação do outro”

 

 

 

 

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